Carta Capital, 12/07/2012
Desenvolvimento regional
Criada à direita, Aliança do Pacífico rivaliza com o ‘esquerdista’ Mercosul
Desenvolvimento regional
Criada à direita, Aliança do Pacífico rivaliza com o ‘esquerdista’ Mercosul
Há cerca de um mês, a criação de um bloco de integração na América
Latina passou quase despercebida no Brasil, mas aparentemente não entre
os líderes do Mercosul. A entrada da Venezuela no mercado sul-americano é
apontada como uma reação à Aliança do Pacífico. Formado por Chile,
Peru, Colômbia e México, o acordo prevê a integração das economias dos
países do oceano Pacífico para que seus integrantes enfrentem a
concorrência asiática e se transformem no motor do crescimento
latinoamericano. Uma proposta que imporá desafios ao projeto de expansão
do Mercosul, como a solução de problemas internos de seus membros, mas
sem inicialmente ameaça-lo.
A Aliança do Pacífico aposta na diversificação de suas relações
comerciais para conter o avanço chinês na região, ao mesmo tempo que
aproveita os benefícios da demanda asiática por commodities.
Todo esse fluxo de comércio comporia uma área de livre circulação de
bens, serviços, capitais e pessoas, em um projeto semelhante ao
Mercosul. A principal diferença apontada pelos líderes dos países do
novo bloco, no entanto, seria a busca por uma integração rápida. Algo
que tornaria o mecanismo mais atraente, embora ele já seja visto como a
iniciativa “mais importante” e ambiciosa da região pelo economista
Roberto Teixeira da Costa, presidente da Câmara de Arbitragem da Bolsa
de Valores de São Paulo. Para ele, o plano acerta ao explorar a ligação
com Pacífico, que coloca o bloco na rota preferida das Américas com a
Ásia, logo, em vantagem ao Mercosul na concorrência pelo mercado
asiático.
O novo bloco, que reúne 40% do PIB da América Latina, 55% de todas
suas exportações e um mercado de 206 milhões de consumidores, possui
planos ambiciosos na relação entre seus membros. O projeto foca na
consolidação de novos investimentos, principalmente em uma maior
integração energética e de infraestrutura, e mais comércio
intrarregional (com colaboração alfandegária). A Colômbia seria o
referencial para as exportações da produção geral, por possuir tratados
de livre comércio com EUA, Canadá e China, por exemplo. Um fator que
pode levar esses itens aos mercados citados em melhores condições de
preço que os do Mercosul.
A Aliança também ataca à burocracia, apresentando o Mercado Comum
Sul-americano como um exemplo a ser ignorado. O grupo pretende avançar
de forma mais rápida sem impedimentos ideológicos em temas comerciais e
de integração, abominando itens como barreiras protecionistas. O
discurso é totalmente liberalizante, seja nas tarifas, comércio
eletrônico, cooperação aduaneira ou investimentos. E mostra também uma
divisão ideológica entre os governos dos países da América do Sul.
Enquanto o Mercosul vive um momento de líderes de esquerda – com a
exceção do Paraguai após a deposição de Fernando Lugo -, a Aliança do
Pacífico reúne os países mais neoliberais da América Latina. A exceção
fica com o presidente do Peru, Ollanta Humala, da esquerda. Mas o
mandatário está preso ao bloco, proposto pelo ex-presidente Alan García,
que conduziu reformas liberais no país andino.
O projeto pretende ter grande envergadura regional e abocanhar novos
membros. Um discurso que começa a rivalizar com os planos de integração
do Mercosul. O novo ministro da Fazenda do Paraguai declarou na última
semana que a suspensão do país do mercado comum sul-americano empurra o
governo paraguaio a buscar alianças com outros países e blocos, que
incluem os EUA e países da Aliança do Pacífico. Mas para Giorgio Romano
Schutte, coordenador do curso de Relações Internacionais da Universidade
Federal do ABC (UFABC), essa ameaça poderia ser contornada com os
países de ambos os blocos realizando acordos econômicos mais flexíveis
por meio da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), embora sempre em
alerta ao eventual avanço da Aliança. “Se a AP entrar na América do Sul,
seria um cenário que a diplomacia brasileira deve atuar.”
Apesar dessa pressão, o Mercosul não deve sentir-se ameaçado. Alguns
elementos da formação da Aliança indicam possíveis dificuldades de
integração dos países do novo bloco. Entre eles, a heterogeneidade dos
interesses comerciais de seus integrantes. Tullo Vigevani, professor da
Universidade Estadual Paulista (Unesp) e especialista em Mercosul,
destaca que o fato de México, Colômbia, Chile e Peru estarem ligados por
tratados de área de livre comércio com os EUA coloca a possibilidade de
uma integração regional e produtiva, como se pretende no Mercosul,
difícil de se deslumbrar. Até porque os países da aliança também possuem
acordos com o Mercosul.
Para o analista, o Mercosul tem mais chances de seguir consolidar uma
integração regional. Isso dependeria, no entanto, de uma solução por
parte dos governos dos países do bloco para suas dificuldades regionais e
de desenvolvimento interno, que tendem a sinalizar com medidas
protecionistas. “Isso não é bom para uma integração, a não ser que se
pensasse em um regional desenvolvimentismo.”
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