Valor, 14/01/2013
Cresce saldo comercial com Venezuela
Sergio Leo
A Venezuela de Hugo Chávez tornou-se, em
2012, o país responsável pelo terceiro maior saldo comercial do Brasil
com seus parceiros no mundo, só atrás da Holanda e da China. A Holanda,
como se sabe, é porto de entrada de mercadorias para a Europa. Se
descontado, do superávit desse país, o resultado do comércio do Brasil
com outros países da União Europeia, os venezuelanos ficaram atrás só da
China na lista de saldos positivos do comércio brasileiro com o
exterior. Os especialistas se dividem ao analisar os efeitos da crise
política no país sobre as crescentes relações comerciais entre o Brasil e
o vizinho caribenho.
A lista de principais produtos de
exportação do Brasil à Venezuela deixa clara a importância das relações
entre os governos na aproximação comercial: dos pouco mais de US$ 5
bilhões de vendas brasileiras ao mercado venezuelano, quase US$ 1,1
bilhão foi em bovinos vivos, para corte ou reprodução, carnes desossadas
de bovino e carne de frango. Açúcar, bebidas e outros alimentos também
estão entre os primeiros itens do comércio bilateral, e, assim como as
carnes, são comprados majoritariamente pelo governo e distribuídos a
preços subsidiados em armazéns estatais.
Os exportadores de carne, principal
produto de exportação do Brasil ao vizinho, estão otimistas, mesmo com
as incertezas provocadas pela doença de Chávez, que o impediu de tomar
posse normalmente na semana passada e alimenta dúvidas sobre o futuro
político do país. “Nossas vendas cresceram 19% no ano passado e a
expectativa é de continuidade no crescimento”, disse ao Valor o
presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de
Carnes (Abiec), Antônio Camardelli. Com a recente autorização do governo
para importações pelo setor privado, deve aumentar a demanda pelo
produto, acredita.
O resultado nas vendas de carnes à
Venezuela poderia ser ainda maior se o setor privado não tivesse
conseguido do governo, no primeiro semestre, uma redução nas importações
de carne de frango, sob alegação de que os produtores nacionais seriam
suficientes para abastecer o mercado. O anúncio oficioso da interrupção
das importações, em junho, levou os exportadores brasileiros e o
Itamaraty a pedirem informações ao governo Chávez, que chegou a
assegurar a manutenção das compras estatais. Mas, ao fim do ano, as
vendas brasileiras haviam caído 42% em relação a 2011. As perspectivas
para 2013 são melhores, porém.
Com o controle de preços de alimentos,
em um período de alta de custos, e falhas logísticas na distribuição
estatal, o país mergulhou em uma crise de desabastecimento, e o ministro
de Alimentação da Venezuela, Carlos Osorio, em dezembro, anunciou que o
governo local retomará a importação de carne de frango, que tem o
Brasil como principal fornecedor.
O aumento das vendas à Venezuela se deu
também em manufaturados. Só as exportações de máquinas de papel, para
projetos de industrialização promovidos por Chávez, aumentou 840%, para
acima de US$ 143 milhões, quase 3% do total das importações venezuelanas
provenientes do Brasil. A grande diversificação da pauta exportadora ao
país vizinho, ainda que fortemente dependente do governo, leva o
presidente da Câmara de Comércio Venezuela-Brasil (Camven), José
Francisco Marcondes, a prever uma tendência crescente para o comércio
bilateral. “Nossa projeção, já a partir 2011 era de que o fluxo de
comércio dobrará até 2014, e essa perspectiva continua”, afirmou ao Valor. A previsão implica em uma corrente de comércio acima de US$ 9 bilhoes até o ano que vem.
“Sem trocadilho, o relacionamento
comercial entre os dois países já é maduro, e a entrada da Venezuela no
Mercosul deve aumentar as oportunidades para as empresas”, comentou o
executivo, brincando com o nome do vice-presidente venezuelano, Nicolás
Maduro. A forte presença de empresas brasileiras com obras ou serviços
de consultoria na Venezuela – como a Odebrecht, que constrói a linha 5
do metrô da capital, Caracas – é outro fator de demanda por mercadorias
brasileiras, diz Marcondes.
Ele aponta, porém, um incômodo na
relação bilateral: o baixo patamar de compras de produtos venezuelanos
pelo Brasil, hoje, em torno de US$ 1 bilhão, com uma queda pouco acima
de 20% registrada em 2012. São, majoritariamente, produtos básicos, como
petróleo e derivados (entre eles ureia, um fertilizante) e minerais em
bruto ou semimanufaturados. A Câmara de Comércio identifica
oportunidades para os venezuelanos, de abastecer os mercados de Norte e
Nordeste, para onde há maior facilidade de transporte. A venda de
energia elétrica, por meio de linhas de transmissão que ligam os dois
países, é o terceiro maior item na pauta de exportações venezuelanas ao
Brasil.
A concentração das compras venezuelanas
de produtos brasileiros nas mãos do governo, de estatais ou de empresas
ligadas ao governo é um risco para o Brasil, especialmente em caso de
transição política, na opinião do diretor-executivo da Associação de
Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Ele crê que
poderia haver uma substituição do Brasil por concorrentes poderosos como
a China, no caso de um esforço maior para o controle da inflação ou
alteração na estrutura de poder do chavismo, hoje favorito para o
governo da Venezuela mesmo em caso de morte de Chávez. O fato de a
Venezuela ter ingressado no Mercosul, estreitando os laços econômicos
com o Brasil, e a melhor qualidade e preço dos produtos brasileiros
impede, porém, qualquer mudança brusca nos fluxos de comércio, disse
Castro. “Em curto prazo, num primeiro momento, não vejo mudanças.”
Publicado por Valor Econômico, em 14/01/13
Acesso via portal da Federasur: http://federasur.org.br/2013/01/14/cresce-saldo-comercial-venezuela/
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