sexta-feira, 13 de março de 2020

Coronavírus: Brasil apresenta grandes desigualdades na distribuição UTIs pelo território nacional e muitas regiões não tem UTIs

Pública, 13 de março de 2020


Em meio à pandemia de coronavírus, Brasil enfrenta “desertos” de UTIs



Levantamento da Pública mostra que quantidade de leitos de UTI no Brasil segue a média da OMS, mas a distribuição desigual deixa áreas do Norte e Nordeste abaixo do recomendado


Anna Beatriz Anjos, Bianca Muniz, Bruno Fonseca, Rafael Oliveira








Mais da metade das regiões de saúde do Brasil possui menos de uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para cada 10 mil pessoas — o mínimo recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Além disso, existem 123 regiões que não possuem sequer um leito de UTI, necessário para atender pacientes em estado grave da doença causada pelo coronavírus (SARS-CoV-2). Segundo informe da Sociedade Brasileira de Infectologia (SIB), a estimativa é de que, a cada 100 pessoas infectadas pelo coronavírus, cerca de cinco precisem de internação em tratamento intensivo.

A média brasileira, que é de 2,3 leitos de UTI para cada 10 mil habitantes, se enquadra nos limites recomendados pela OMS — de 1 a 3 leitos para a mesma quantidade de pessoas. No entanto, mais de 80% das regiões de saúde no país não atingem esse parâmetro da OMS. A situação é pior no Norte e Nordeste onde a maioria das regiões de saúde está abaixo da média recomendada. Já nos três estados do Sul, a maioria das regiões segue a definição da OMS.



Os dados são resultado de um levantamento exclusivo da Agência Pública com informações de 450 regiões de saúde listadas no Sistema de Apoio à Gestão Estratégica do Ministério da Saúde. As regiões são grupos de municípios, na maior parte das vezes vizinhos e com características sociais e econômicas parecidas, definidos para ajudar a elaborar e executar as ações do governo em saúde. A reportagem contabilizou os leitos do Sistema Único de Saúde (SUS) e também os privados.

 

 

Distribuição de leitos de UTI por regiões de saúde






Em todas as regiões de saúde de Roraima, por exemplo, o número de leitos de UTI por habitante não atinge a média. No Pará, há apenas uma região dentro da média: a área que engloba a capital Belém e os municípios vizinhos de Ananindeua, Marituba, Benevides e Santa Bárbara do Pará. Nesta semana, governadores dos estados do Amapá, Pará, Maranhão, Mato Grosso, Amazonas, Tocantins, Acre e Roraima assinaram uma carta pedindo mais recursos do Governo Federal e a abertura de leitos adicionais de UTI na região.

A desigualdade de oferta de UTIs é um problema para o tratamento do quadro clínico causado pelo coronavírus, já que, nos casos mais graves, é necessária a internação do paciente. “Uma coisa é uma pessoa ir a um posto de saúde em Belo Horizonte, conseguir fazer um teste, ter o diagnóstico positivo e então ser encaminhada a um hospital, onde vai ficar internada e pronto. Outra coisa é isso acontecer no interior do Amazonas”, afirma o economista Pedro Amaral, professor do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e integrante de um grupo de pesquisa que analisa a distribuição espacial da oferta de serviços de saúde no Brasil. “As pessoas [nessas regiões] não têm um risco maior de pegar a doença, mas de morrer pela doença. Se precisarem de uma UTI, talvez não tenha leitos na região delas, porque a disponibilidade é menor. A desigualdade vai pegar no risco de mortalidade.”

Essa situação, sobretudo no Norte e Nordeste, faz com que a população que vive em regiões onde a quantidade de UTIs está abaixo do recomendado precise se deslocar para ter mais chance de internação. “Em momento algum podemos esperar que todos os municípios tenham leitos de UTI, o sistema de saúde nunca pode ser pensado assim. Nas regiões Norte e Nordeste, os leitos tendem a estar concentrados nas capitais ou cidades grandes. Mesmo quando a quantidade total de leitos é suficiente, eles estão mais concentrados, então a população fica mais afastada dessa oferta”, aponta Amaral.

Segundo os dados do Ministério da Saúde, essa é a situação de quem vive em algum dos cinco municípios que integram a região de saúde do rio Madeira, no leste do Amazonas, onde não há sequer um leito de UTI. A população estimada na região é de quase 200 mil pessoas.

A diferença na oferta de atendimento em terapia intensiva não se restringe apenas ao Norte e Nordeste do país. Há diversos “desertos” de leitos de UTI ou com quantidade abaixo da média por todo o Brasil. Em Minas Gerais, quase metade das regiões está abaixo da recomendação da OMS — no norte do estado, há uma série de municípios cuja região não tem nenhuma UTI.
 

Fonte:
Pública, 13 de março de 2020






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